O Dr. Peres Metelo, no DN de 20 de Dezembro de 2004, escreve: "A despesa pública corrente, isto é, tudo aquilo que o Estado gasta que não sejam encargos da dívida pública nem despesas de investimento, cresceu 6% entre Janeiro e Novembro deste ano." Mais adiante continua. "... é que a conta do Estado está a crescer ao dobro da velocidade da criação da riqueza do País." E depois: "É que para se poder consolidar seja lá o que for nas Finanças Públicas, é condição necessária que se aumente o potencial de criação de riqueza da nossa economia e que esta cresça bem acima das despesas do Estado." Nós sabemos como fazer. Não nos damos é ao trabalho de levar a cabo medidas que outros contestem. E continuaremos assim enquanto os governantes continuarem sem espinha dorsal. Temos gente capaz para resolver as situações, mas continuamos a brincar aos suicidas. Quando Cavaco Silva falou em políticos incompetentes, julgo que não se estava a referir a membros do Governo. Os visados seriam os Deputados onde o peso é excessivo, onde há gente a mais e onde a qualidade é bastante fraca. O Deputado entra e fica em roda livre. É um peso morto que comete erros por impreparação. Olham o chefe e imitam-no. Algumas vezes excedem-se para tentar dar nas vistas. Fazem-no nos apartes. Mas se lhes entregam um ou outro trabalho, ele não sai perfeito. Os mais capazes nunca perdem tempo para os ensinar, encaminhar, saber procurar documentos e analisar os assuntos correntes. São muitos os deputados. São demasiados. Privilegia-se a quantidade em vez da qualidade. É um clube de amadores e exigem-se profissionais. Era mais ou menos isto que Cavaco Silva quereria dizer, mas como disse, cada um interpretou o tiro à sua maneira. Esta é uma das pechas do português, fala e não explica, não tem coragem de ir até ao fim, com receio de ferir susceptibilidades. Fere muito mais porque a incerteza é pior do que a frontalidade. Cada um faz as suas conjecturas e ninguém aprende nada com o que foi dito, bem pelo contrário, lança-se a confusão, quando o momento não é o mais oportuno para o fazer. Cavaco Silva devia ter pensado: "eles sabem para quem é o recado". Mas como todo o País ouviu o recado, noventa e nove por cento ficou a apontar o dedo na direcção errada.
Em 1978, depois de uma intervenção no Parlamento, um pouco tempestuosa, e tendo sido convidado a retirar o que acabara de dizer, perante a minha recusa, o então Presidente Dr. Teófilo Carvalho dos Santos, homem impoluto, disse-me que, em face da minha teima, se via forçado a fechar o Parlamento. Ao que repliquei: "Feche, Vossa Excelência, esta casa e ficará na história. Este Parlamento nunca serviu, nem serve o Povo Português, só lhe gasta o dinheiro..."claro que ele fechou o Parlamento por alguns minutos. Não falo dos corruptos. Esses são um mundo à parte e um verdadeiro cancro do país. O Estado chega a pagar por serviços de quinhentos euros, cinco e seis mil. E é aqui que as despesas do Estado são outro buraco sem fundo. Dei o exemplo nos milhares, mas há pagamentos de milhões. Por isso mesmo, logo que foi conhecido o relatório de Camarate em que uma auditoria da Inspecção-Geral de Finanças à actividade do Fundo de Defesa Militar do Ultramar revelou que Portugal vendeu armas ao Irão, Guatemala, Argentina e Indonésia e que em 1980, quatro dias depois da morte do Engenheiro Adelino Amaro da Costa, foram vendidas armas para o Irão, foi indicada a existência de um "saco azul" através do qual teriam sido desviados 40 milhões de euros. Apareceram logo os mais escandalosos boatos devido à descoberta deste caso e à queda precipitada do Governo. Felizmente que a comunicação social não alimentou o fogo.
Aquilo que fizeram a Santana é inadmissível. Não houve cão nem gato que não o atacasse para lhe tentarem diminuir o carisma, se calhar preferiam-no ginecófobo. Era muito difícil, com tanto zoilo a morder-lhe nas canelas, governar capazmente. Santana, por mais que quisesse concentrar-se na governação, o ruído era tal, que ele tinha, fatalmente, de abrir brechas. Não é justo que se trate desta maneira um Primeiro-Ministro, seja ele de que Partido for. O País não pode continuar a ser governado sob o fogo da má-língua, da intriga, da hipocrisia e da incontinência verbal, a menos que todos prefiram um País ingovernável. O erro de Santana foi ter perdido demasiado tempo a responder a quem mais não faz do que se entreter com os jogos de palavras. Nisso, alguns pretendentes, ao passadio governamental, são exímios em desbancar os outros para eles amesandarem. Essa foi a sua fraqueza, ao responder àquilo que não devia. Democracia é democracia, mas o povo, o que quer é ser governado. E ele depressa arranjou uma divisa que diz, mais ou menos, isto: "Democracia sem comedoria é gaita que não assobia". O meu amigo Dr. José Patrício costuma dizer: o País já não suporta mais fantochadas. Esta democracia mais parece uma anarquia, que umas vezes funciona e outras não, porque o homem ainda está a milhares de anos da "inteligência" das formigas.
A revolução que toda a gente aceitara melhor ou pior, mas confiante na mudança foi descambando em vivas, morras, ameaças, greves, e muita irresponsabilidade. Tanta, que acabaram por delapidar a pesada herança que Salazar e Caetano tinham acautelado nos cofres do Estado. O FMI ameaça que ou tomávamos juízo ou não avalizava mais asneiras. A CEE estendeu-nos a mão em 1985. Depois passou a União Europeia. Com as costas quentes, Portugal teria todas as possibilidades para singrar e se colocar, rapidamente, a par dos povos mais ricos, mais prósperos e mais civilizados da Europa. Que fizeram os políticos? Esbanjaram o património apesar de terem recebido centenas de milhões de euros da União Europeia. Aquilo que fizeram é o mínimo que qualquer analfabeto seria capaz de fazer. E continuam todos com a cara na água, satisfeitos da obra, enganando o povo, a quem distribuem migalhas, a quem não ensinam e que começa a olhá-los de soslaio. A tempestade paira no ar e, ou eu muito me engano ou isto vai acabar mal. Neste momento estamos sem Governo. Quase apetece perguntar: Precisamos de Governo para quê? Precisamos de Presidente para quê? Precisamos de Parlamento para quê? Quanto nos custam estas instituições? Elas valem a pena? Porque não somos só governados pelos Directores Gerais que já existem? Isto começou a não ser um país a sério. Alguém virá de fora para nos governar tal como nós enviamos de dentro, um dos nossos, Governar os outros. O Presidente da Comissão Europeia, José Manuel Durão Barroso, nasceu nos nossos campos, bebeu o nosso leite, alimentou-se do nosso Sol e da alegria saudável e pura das nossas gentes. É um Português. Nós somos diferentes dele? Não. Os Governos dos outros países da Europa escolheram-no porque ele é o melhor. O português é um governante nato. Em cada português há um presidente e é por isso que somos um Povo dificilmente governável. É por isso que os nossos governantes falham. Como os governantes não governam, os portugueses governam-se e dão sinais de aviso. Este momento por que passamos parece-me ser o sinal mais evidente que a transformação do País começou. Vejamos os passes desta nova revolução, que sobe das bases e que obriga os políticos, os empresários, os gestores, os professores, os comerciantes, os pescadores e os agricultores a usar vinte por cento da sua inteligência para entenderem que a sua sobrevivência está na sobrevivência de um Povo que começa a estar saturado de tanta incompetência, de tantas facilidades, de tanto medo de alguém governar racional e inteligentemente. Perante a vil situação em que nos encontramos: sem dinheiro, sem dignidade e sem Governo, apelo à sua inteligência para que mostre compreensão pelo Governo que venha a sair das eleições, seja ele qual for, mas não lhe perdoe os luxos, os gastos sumptuosos, a inépcia, a corrupção. Os sacrifícios têm de caber a todos. Seja de Esquerda, da Direita, do Centro, da Extrema-Esquerda ou da Extrema-Direita, fique acima de qualquer um destes rótulos. Todos temos de estar unidos. Todos somos portugueses. Quando os políticos se comportam como estátuas (simulacrum, i), os cidadãos devem tomar conta do seu próprio destino e perante a inoperância destes simulacros, mesmo que seja obrigatório sustentá-los, devemos cumprir as leis e rentabilizá-las de maneira que nesta casa todos vivam confortavelmente até que os governantes aprendam a governar ou definitivamente se envergonhem por não o fazer. As qualidades dos portugueses, os seus genes são os mesmos daqueles que criaram Portugal a partir da vontade e da inteligência. |
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