NUNO

Isso, toma conta deles. O louco não és tu. Faz o que quiseres.

(a criada anuncia Freitas Fortuna)

CRIADA

Chegou o sr. Freitas Fortuna.

ANA

Manda entrar. E tu, meu filho (para Jorge) vai com o Nuno.

JORGE

Eu não quero.

NUNO

Anda Jorge, o Freitas vem aí e ele quer estar à vontade. Talvez o que não consegue a família consiga o amigo.

(Nuno passa o braço sobre o ombro do irmão e saem. Ouve-se Nuno)

NUNO

Não compreendo... Uma mulher inteligente... (sai) (ouve--se Jorge repetir "uma mulher inteligente,")

FREITAS

Cheguei na hora errada?

ANA

Chegou no momento certo.

CAMILO (dirigindo-se a Freitas)

O Nuno fica impertinente quando bebe mais do que a conta.

ANA

Não te aborreças, meu querido.

CAMILO

Eu sou o culpado.

ANA

Fizemos tudo para eles serem felizes.

CAMILO

Tu fizeste. Os livros fizeram-me esquecê-los. Só tarde descobri que tinha um filho louco e dois bêbados e desordeiros.

ANA

Eu quis preservar o teu trabalho. Tive muito mais culpas. Eu é que não os soube criar.

CAMILO (com as mãos na cabeça)

Como é possível terem passado tantos anos sem conhecer os meus próprios filhos?

FREITAS

A tua obra é muito importante, é natural que a família saia prejudicada...

CAMILO

Nenhuma obra pode ser mais importante que a familia. Eu sacrifiquei-a por causa de meia dúzia de frioleiras.

ANA

É a tua vida.

CAMILO

O Nuno, nem tem instrução, nem é culto, mas não é parvo. Ele tem razão. Sacrifiquei tudo e todos para atingir os meus objectivos... chego ao fim da vida desiludido, cansado, doente e infeliz... não sei se resistirei...

ANA

Eu fui a culpada. Cega pelo teu brilho, pela facilidade com que escrevias, preparei sempre o caminho para não seres importunado. Tu, escreveste livros a um ritmo alucinante.

CAMILO

Não pensei na família.

FREITAS

A tua obra é monumental.

ANA

Livros ponderados, objectivos e úteis para o desenvolvimento mental de um povo que dá os primeiros passos na leitura. Foi sacrificada uma família a bem de um país.

CAMILO

Não me dei conta que era isso que eu estava a fazer. Eu só pensei na sobrevivência.

ANA

Eu amo-te, meu querido, e temos o suficiente para viver.

CAMILO

Por minha causa deixaste de escrever.

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